1.12.12

A criança e sua sombra



No seu célebre ensaio sobre o "Estádio do espelho", escrito em 1936, Lacan postulou a constituição do Eu ligado à imagem do próprio corpo. Em algum momento, a partir dos seis meses, antes que tenha adquirido a coordenação motora completa, a criança mostra uma expressão de júbilo ao ver sua imagem refletida no espelho, do que se deduz que, na imagem, a criança reconhece o seu próprio corpo. Embora o infans não tenha condições neurológicas para dominar a organização de seu esquema corporal, exibindo um estado de dependência e impotência motora, ele experimenta uma visão global da forma de seu corpo. Enquanto antes vivenciava-se como um corpo desmembrado  através dessa experiência, a criança antecipa o domínio do seu corpo, achando-se, cativada, fascinada pela imagem no espelho e se rejubila. Por trás desse júbilo, entretanto, oculta-se um logro, fonte da alienação imaginária que perseguirá o humano para sempre.